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quarta-feira, setembro 18, 2024

Educação em Manaus: R$ 8 bilhões investidos e a realidade distorcida da propaganda municipal

Enquanto a gestão de David Almeida tenta se promover em comerciais, a educação de Manaus enfrentou polêmicas, nos últimos anos, envolvendo a valorização dos professores e alimentação escolar

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Entre a expectativa e a realidade de Manaus, existe uma opinião final que a Prefeitura de Manaus pode influenciar: a população. Nos últimos quatro anos, a gestão do prefeito David Almeida (Avante) tem destacado pontos de melhoria da educação do município, porém, de acordo com a população, a realidade é diferente do que é mostrado nos comerciais da prefeitura.

Uma das promessas de campanha da gestão de David Almeida era deixar Manaus com uma das melhores cidades em educação do Brasil. Apesar de ter conseguido esse mérito, colocando a educação manauara em 5º lugar no país, segundo o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), a gestão municipal passou por diversas polêmicas para chegar até o resultado, polêmicas essas que tinham no comando da Secretaria Municipal de Educação a irmã do prefeito, Dulce Almeida.

Durante os 4 anos da gestão de David Almeida, a pasta que foi comandada pela irmã do prefeito, Dulce Almeida, foi o órgão da prefeitura que recebeu o maior orçamento, de acordo com o demonstrativo da Lei Orçamentária Anual, publicado no Portal da Transparência de Manaus. Em toda gestão de David Almeida, a Secretaria Municipal de Educação teve a disposição R$ 8,1 bilhões do orçamento de Manaus.

Mesmo com um orçamento de bilhões, a Semed passou por algumas polêmicas nos últimos anos, entre elas a valorização dos professores. O conflito entre a classe e a Prefeitura de Manaus se intensificou entre o ano de 2023 e os primeiros meses de 2024, quando a base aliada do prefeito David Almeida na Câmara Municipal de Manaus tentou aprovar em regime de urgência um reajuste de pouco mais de R$ 30 no salário dos profissionais da educação.

Foram quase dois meses para o projeto de reajuste salarial dos professores ser votado na CMM. O aumento só foi aprovado na segunda semana de junho, apesar de ter sido enviada à Casa no mês de maio. No reajuste anterior, a gestão de David Almeida queria conceder o total de 1,25% de aumento, porém, após discussões e protestos da classe educadora, o reajuste oferecido foi de 3,69%.

O protesto da classe não foi somente para conseguir um reajuste salarial durante esse período. Enquanto cobravam por aumento da data-base, atualização do Plano de Cargos e Carreiras – desatualizado há 10 anos, os professores também precisaram buscar o direito de receber os valores do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica, o Fundeb.

No passado até os primeiros meses de 2024, os servidores da rede municipal de educação protestaram sobre os repasses não recebidos desse fundo. Na época, a Secretaria Municipal de Educação afirmou que os recursos foram aplicados conforme a legislação, mas o Sindicato dos Professores questionou a transparência na aplicação dos recursos.

Para aplicação em 2023, o Amazonas recebeu mais de R$ 4 bilhões em recursos ajustados do Fundeb. A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) estima que o Fundeb de Manaus para o ano de 2023 ficou estimado em R$ 1,3 bilhão. O valor, segundo a confederação, foi de R$ 74 milhões a mais que em 2022.

Para a população, o não pagamento do Fundeb aos profissionais de educação não foi bem visto em Manaus. “Não sei nem dizer se é desvio, se não estão mandando. Porque eles falam uma coisa e vemos outra coisa completamente diferente. Eles dizem que são a voz do povo, não são nada, não existe isso. Somos fracos na frente deles”, disse a comerciante Maria da Conceição Alves.

Em consulta ao Portal da Transparência, O Convergente constatou que a Prefeitura de Manaus, em janeiro de 2023, recebeu o valor de R$ 1,4 bilhão de transferências do Fundeb. Apesar desse recurso bilionário, meses depois o prefeito David Almeida informou que não haveria saldo para destinar os recursos para os profissionais a educação.

De acordo com a LOA de 2024, o valor orçado para as transferências do Fundeb foi de R$ 1,5 bilhão. No entanto, a Prefeitura de Manaus ainda não mencionou se este ano os recursos serão destinados aos professores.

Alimentação escolar

Em maio, a Semed protagonizou outra polêmica: qualidade da merenda escolar. Pais e alunos matriculados na Escola Municipal Aristóphanes Bezerra denunciaram que encontraram larvas nos alimentos servidos na merenda escolar da unidade.

O assunto repercutiu na Câmara Municipal de Manaus e gerou embate entre oposição e base, mas o que ficou marcado foi a frase: “Merenda não é almoço”, dita pelo vereador Professor Samuel (PSD).

Na época, O Convergente noticiou a fala do parlamentar, que logo após a repercussão usou a tribuna para afirmar que o seu comentário havia sido tirado de contexto. Para a equipe de reportagem, a população expôs a opinião sobre o assunto.

“Vi um vereador aí, infelizmente eu acompanhei, dizendo que merenda não tinha que ser almoço. Eu lá atrás, quando estudei em 70 e alguma coisa, a merenda era muito boa, tinha arroz, feijão […]. As vezes a criança já vai para a escola pensando na merenda”, disse o autônomo Erton Queiroz.

“Ele foi infeliz nessa fala, os filhos dele devem não precisar. Merenda, você sabe que algumas crianças vão para a escola precisando disso. Ficamos duvidando, se um dinheiro desse bem investido, com certeza não é para faltar merenda na escola”, alegou o aposentado Ozomar Ferreira.

Dias após a fala do vereador repercutir em meio aos casos de denúncias, a então secretária da Semed Dulce Almeida usou as redes sociais para fazer uma propaganda sobre a qualidade da merenda escolar dos alunos, alegando que os alimentos seriam servidos baseados em uma tabela montada por nutrólogos, bem como também seriam servidos alimentos ricos em nutrientes.

Em 2024, a Prefeitura de Manaus tem disponível o orçamento de R$ 9 bilhões, de acordo com a Lei Orçamentária Anual (LOA) aprovada pela Câmara Municipal de Manaus (CMM). Deste montante, R$ 2,3 milhões são para a Educação. Vale destacar que esse é o maior orçamento do Executivo Municipal e representa mais de 25% do total de recursos previstos.

Conforme apurou O Convergente, a Prefeitura de Manaus recebeu mais de R$ 24,5 milhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), referentes ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), de acordo com o Portal da Transparência.

Conforme a transferência de janeiro, a Semed distribuiu os recursos entre as redes de ensino por categoria. A escola de educação especial, por exemplo, obteve um orçamento de R$ 187 mil para a merenda escolar.

O maior valor foi destinado à pré-escola, totalizando R$ 6,7 milhões. As creches receberam um orçamento de R$ 1,7 milhões; as escolas indígenas foram contempladas com R$ 120 mil; as unidades de educação de jovens e adultos receberam R$ 1,1 milhão; e o ensino médio foi alocado com um orçamento de R$ 290 mil.

Importante ressaltar que, de acordo com o Portal da Transparência, a Semed ainda possui um valor orçado de R$ 630 mil para a merenda escolar proveniente de recursos vinculados.

O Convergente também fez uma análise dos valores arrecadados. No mês de maio, por exemplo, a alimentação escolar indígena arrecadou apenas R$ 2,3 mil dos recursos federais. A maior arrecadação foi a alimentação pré-escolar, que teve R$ 648 mil.

Segundo o FNDE, a transferência dos valores é feita em 10 parcelas mensais, de fevereiro a novembro, para a cobertura de 200 dias letivos. O levantamento do valor é feito com base no Censo Escolar levantado no ano anterior, ou seja, o valor milionário representa as mais de 500 escolas municipais de Manaus.

O FNDE pontua que 30% do valor repassado pelo PNAE deve ser investido “na compra direta de produtos da agricultura familiar, medida que estimula o desenvolvimento econômico e sustentável das comunidades”, de acordo com a Lei nº 11.947, de 16/6/2009. Ou seja, a Semed não estaria seguindo uma das leis servindo bolacha e suco para os alunos.

“Nunca falam que comeram frutas, maçã, abacaxi. Nunca vi minha neta chegar e falar, ela chega e fala que comeu uma canjinha, mas nunca tem fruta. Isso [canja] não é alimento”, afirmou a comerciante Maria da Conceição Alves.

Após as denúncias, o Ministério Público do Amazonas (MPAM) iniciou um Procedimento Preparatório para investigar os casos de possíveis irregularidades na merenda escolar.

A abertura do procedimento originou-se depois do órgão ser acionado por meio de uma Notícia Fato, que apontava irregularidades na qualidade da merenda escolar na Escola Municipal Joaquim da Silva Pinto. O prazo para instrução da Notícia de Fato expirou, levando à abertura do Procedimento Preparatório para investigar as alegações, tanto o suposto desvio de merenda escolar na unidade quanto a insuficiência do cardápio servido na escola.

Outro lado

Em todos os casos relatados pelo O Convergente, a equipe de reportagem buscou esclarecimentos da Secretaria Municipal de Educação de Manaus, que chegou a enviar notas de esclarecimento a respeito do repasse do Fundeb, por exemplo.

Com as pontuações da população, bem como também as narrativas abordadas durante esta reportagem, O Convergente buscou contato com a Secretaria Municipal de Educação para esclarecer as seguintes questões:

As escolas revitalizadas, qual o número atualizado e quantas faltam receber os serviços?; A data-base dos professores já foi paga? Há previsão de pagamento do Fundeb aos servidores da educação em 2024?; Sobre alimentação escolar, como tem sido feita a distribuição e acompanhamento adequado nas escolas municipais?; Qual o posicionamento da Semed sobre denúncias da qualidade da infraestrutura das escolas e qualidade da merenda escolar?

Até a publicação desta matéria, a Secretaria Municipal de Educação não deu retorno. O espaço segue aberto para justificativas e envio de nota.

Assista a nossa websérie completa aqui:

Leia mais: Mesmo com repasses e contratações milionárias, população aponta irregularidades em pavimentação e transporte público na gestão de David Almeida

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Por Camila Duarte

Foto: Marcus Reis

Revisão: Letícia Barbosa

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