Os desmandos, os indícios de superfaturamento e a suspeita de funcionalismo fantasma, além de outros crimes de responsabilidade podem alcançar o presidente da Câmara Municipal de Manaus (CMM), David Reis (Avante) e resultar em perda de mandato.
Conforme os parâmetros da legislação brasileira, a prática de crime de responsabilidade pode levar o político com mandato a sofrer um processo de cassação ou impeachment tanto no âmbito federal, estadual quanto municipal.
Sobre David pesam suspeitas de funcionalismo fantasma e dúvidas quanto a lisura da licitação que resultou na autorização para compra de café e de açúcar por R$ 80 mil com a justificativa de “aumento na demanda da Casa após a diminuições das restrições da Covid-19”. Ambas as suspeitas estão sob análise do Ministério Público do Estado (MP-AM).
Quanto a suspeita de existência de funcionários fantasmas na CMM, o MPAM recomendou a instalação de um ponto eletrônico na casa legislativa para evitar “fragilidade” no sistema manual de frequência dos funcionários. A recomendação, porém, de forma deliberada ainda não foi acatada pelo presidente David Reis.
A denúncia quanto a compra superfaturada de café e açúcar foi feita pelo Comitê Amazonas de Combate à Corrupção nesta terça-feira, 2/8. A representação encaminhada ao Procurador-geral de Justiça do Amazonas, Alberto Rodrigues do Nascimento Júnior aponta indícios de que a gestão de David Reis contratou a empresa A S OLIVEIRA & CIA LTDA-ME, CNPJ n.º 06.216.307/0001-00, para fornecer os produtos por preços acima dos praticados no mercado, “evidenciando assim que pode ter havido superfaturamento na compra dos produtos café e do açúcar, conforme tabela produzida pelo Comitê e anexada na representação”.
O Comitê solicitou ainda que seja instaurada investigação cível cabível contra David Valente Reis e os demais responsáveis e beneficiários pelo processo de contratação. Caso seja comprovado o superfaturamento/sobrepreço, requer, ainda, sejam promovidas as ações judiciais cabíveis, nos âmbitos cível e criminal, com o consequente ressarcimento ao erário do município.
Sobre a denúncia do Comitê, em nota, David Reis afirmou que a entidade tem assegurado o direito de se manifestar sobre assuntos que entenda serem pertinentes de sua área de atuação.
“Na condição de defensor dos direitos e garantias protegidas pela Constituição Federal, David Reis acredita que é preciso possibilitar o espaço necessário para que a Democracia cresça e amadureça cada vez mais, e que, caso seja consultado pelos órgãos de controle a prestar esclarecimentos, de pronto o fará, seguindo os princípios de seriedade e transparência com que administra o parlamento municipal”, diz a nota.
Perda de mandato – Os fatos, porém, caso comprovada a existência de irregularidades, podem fazer com que as denúncias motivem não apenas a perda da presidência da CMM, como também a perda do mandado como vereador. Somam-se a suspeita de funcionalismo fantasma, sobrepreço na compra de café e açúcar, irregularidades na contratação de segurança armada, de serviços de telefonia por R$ 1,9 milhão, de 80 estagiários dispensa de licitação por 1.134.777,60 e outros.
Especialistas – As práticas, segundo especialistas consultados pelo Portal O Convergente, podem resultar em punições legislativas desde que sejam motivadas por denúncias. Somente após isso, dependendo da configuração jurídica, pode haver votação no plenário da casa legislativa a qual compõe a figura política envolvida nas denúncias. É o que explica o especialista em direito eleitoral, Anneson Souza.
“A denúncia escrita da infração poderá ser feita por qualquer eleitor desde que haja a exposição dos fatos e a indicação das provas. Se o denunciante for vereador ficará impedido de votar sobre a denúncia e de integrar a Comissão processante, podendo, todavia, praticar todos os atos de acusação”, explicou.
O especialista explicou ainda que um pedido de impeachment de vereadores pode ocorrer com base nas prerrogativas definidas nas hipóteses previstas pelo art. 7º, do Decreto-Lei 201/1967. No entanto, a situação deve ser analisada e julgada pela própria Câmara Municipal.
“Se o denunciante for o presidente da Câmara, ele passará a presidência ao substituto legal, para os atos do processo, e só votará se necessário para completar o quórum de julgamento. Será convocado o suplente do vereador impedido de votar, o qual não poderá integrar a Comissão processante”, esclareceu o advogado ao dizer que, no caso do denunciado ser o próprio presidente da CMM, “o vice-presidente da Câmara fica responsável por receber ou não a denúncia”.
Na maioria dos casos, quando se trata de vereadores e deputados, a prática mais comum é a cassação do mandato, que pode ter regras diferentes em cada município, de acordo com as Leis Estaduais, Leis Municipais e Regimento Interno de cada Câmara. Entretanto, o Decreto Lei 201/67 dispõe sobre a responsabilidade de prefeitos e vereadores, servindo também como regra básica para cassação de seus mandatos.
Além dele, o Art. 55 da Constituição Federal também tem parâmetros que falam sobre o assunto. É o que explicou a advogada, especialista em direito eleitoral, Maria Benigno. “Na esfera legislativa existe um processo pelo qual o parlamentar pode perder o mandato que é o processo de cassação. O mesmo está regulado no artigo 55 da CF e cada Constituição Estadual ou lei orgânica municipal reproduz a regra, o procedimento ou rito do processo, que é descrito nos regimentos internos das respectivas casas legislativas”, disse a especialista.
Ações – Em vários aspectos um ente público pode se criminalmente condenado, seja na esfera eleitoral ou jurídica. Na esfera pública um dos artigos relacionados ao assunto, o art. 7º, referente ao Decreto Lei nº 201 de 27 de Fevereiro de 1967, diz que a Câmara poderá cassar o mandato de vereador quando o mesmo “Utilizar-se do mandato para a prática de atos de corrupção ou de improbidade administrativa; Fixar residência fora do Município;” ou “Proceder de modo incompatível com a dignidade, da Câmara ou faltar com o decoro na sua conduta pública”.
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Da Redação
Foto: Divulgação / Ilustração: Marcus Reis