A Prefeitura de Manicoré, sob comando do prefeito Lúcio Flávio do Rosário (PSD), vem acumulando contratos milionários com empresas já investigadas por suspeitas de irregularidades. As polêmicas envolvendo a gestão municipal foram analisadas pelo novo levantamento dos dossiês dos municípios do Amazonas do O Convergente.
Entre contratos milionários com empresas já investigadas por irregularidades, decretos de emergência e punições aplicadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-AM), a gestão atual levanta questionamentos sobre legalidade, transparência e prioridades no uso dos recursos públicos.
Localizado a 331 quilômetros de Manaus, Manicoré tem cerca de 53,9 mil habitantes, segundo dados do IBGE (2022), com um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em 0,582. O município ocupa posição estratégica no sul do Amazonas, com economia baseada na agricultura familiar, extrativismo e comércio.
De fevereiro a agosto de 2025, a gestão municipal movimentou cifras que somam valores milionários, ao mesmo tempo em que enfrenta críticas de órgãos de controle e decisões judiciais por falhas administrativas.
Reparos por R$ 9,5 milhões
Logo no início do ano, Lúcio Flávio firmou contrato de R$ 9,5 milhões com uma empresa alvo do Ministério Público Federal (MPF) em um processo de improbidade administrativa relacionado ao próprio município.
O contrato, publicado no Diário Oficial dos Municípios (DOM-AM), previa reparos em escolas e prédios educacionais de Manicoré, tanto na área urbana quanto na rural. O valor, de R$ 9.582.408,23, é destinado à manutenção da rede municipal de ensino e teria vigência de 360 dias.
O histórico da empresa, no entanto, levantou questionamentos sobre a lisura das escolhas da prefeitura. Ao retomar a parceria com uma empresa já investigada por má gestão de recursos públicos, a administração municipal se coloca novamente no centro de dúvidas sobre critérios técnicos e transparência em licitações.
Sentenca-ManicoreeContrato milionário com empresa investigada pelo MP
Pouco depois, a Prefeitura de Manicoré assinou contratos que somam mais de R$ 10 milhões com a Plastiflex Empreendimentos da Amazônia Ltda, também investigada pelo Ministério Público do Amazonas (MP-AM) em gestões anteriores.
Os serviços contratados incluíram obras de drenagem, recapeamento asfáltico, pavimentação e até manutenção do sistema de abastecimento de água. Publicados no Diário Oficial da AAM, os extratos contratuais mostram que a empresa ficará responsável por um leque de atividades essenciais à infraestrutura da cidade.
Apesar do caráter abrangente, o valor elevado — R$ 10.144.271,58 — e o histórico da empresa reacenderam debates sobre possíveis favorecimentos e falta de concorrência real em licitações.
Contrato milionário em plena emergência
A situação se agravou em abril, quando Manicoré decretou situação de emergência devido à cheia do Rio Madeira, que atingiu 90% das áreas de várzea e isolou mais de 150 comunidades ribeirinhas. No dia seguinte ao decreto, a prefeitura homologou um novo contrato de R$ 6,3 milhões com a Plastiflex para manutenção e reparo de prédios públicos.
O documento não especifica prazos de início ou quais prédios seriam beneficiados, e foi assinado justamente em meio à crise humanitária que exigia medidas emergenciais de assistência às famílias atingidas. A coincidência entre decreto e contrato reforça suspeitas de uso político da situação excepcional para justificar gastos vultosos sem detalhamento transparente.
PLASTIFLEX-CNPJMulta do TCE-AM por falhas previdenciárias
No mês seguinte, Lúcio Flávio foi alvo direto do Tribunal de Contas do Estado (TCE-AM), que aplicou multa de R$ 14 mil por falhas na gestão previdenciária do município.
De acordo com o relatório da Secretaria de Controle Externo (Secex), foram identificadas 25 pendências administrativas relacionadas ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). Entre as irregularidades estavam:
Falta de repasses de contribuições previdenciárias; Inconsistências nos demonstrativos contábeis e atuariais; Descumprimento das alíquotas legais; Ausência de estrutura adequada da unidade gestora; Não implantação da previdência complementar obrigatória.
Na prática, a omissão compromete a emissão do Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP), documento fundamental para que o município possa receber transferências voluntárias da União. Ou seja, além de expor falhas administrativas, o problema coloca em risco o acesso de Manicoré a recursos federais.
Revitalização esportiva de R$ 2,3 milhões
Mesmo após as críticas e a multa do TCE-AM, a prefeitura voltou a contratar a Plastiflex em agosto, desta vez para a revitalização do Complexo Esportivo do bairro Santa Luzia. O valor do contrato, R$ 2,3 milhões, foi formalizado pela Secretaria Municipal de Esporte e Lazer com vigência de um ano.
Embora obras esportivas tenham importância social, o investimento em pleno contexto de emergência e com empresas sob investigação levanta questionamentos sobre prioridades de gestão.
Mais uma vez, a prefeitura recorreu à Plastiflex, reforçando um padrão de repetição de fornecedores investigados, em vez de diversificar os contratos e estimular a concorrência saudável no setor.
Outro lado
Diante do compilado de escândalos envolvendo a gestão do atual prefeito de Manicoré, O Convergente entrou em contato com o município para solicitar um posicionamento sobre as polêmicas envolvendo a gestão municipal.
O Convergente tentou contatar a empresa Plastiflex para buscar um posicionamento a respeito, mas não localizou o endereço eletrônico da empresa, uma vez que a empresa não disponibilizou o e-mail no sistema da Receita Federal. É informado um número para contato, porém, ao tentar buscar contato por ligação, o telefonema não completa.
Vale ressaltar que, em todos os casos narrados neste dossiê, O Convergente entrou em contato com a Prefeitura de Manicoré – via e-mail – buscando um posicionamento e garantindo o direito de resposta dos envolvidos.
Reforçamos que espaço segue aberto para que as partes possam prestar esclarecimentos.