Após ação do Ministério Público Federal (MPF), o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro ao pagamento de R$ 1 milhão por danos morais coletivos por falas de conteúdo racista proferidas em 2021. A decisão foi emitida pela Terceira Turma do Tribunal nessa terça-feira (16), de forma unânime.
A União também foi condenada a pagar a mesma quantia. Ainda cabe recurso da decisão às cortes superiores.
Histórico do caso – A ação civil pública foi proposta pelo MPF e pela Defensoria Pública da União (DPU) em julho de 2021, após Jair Bolsonaro, à época presidente da República, dirigir-se a um apoiador nos arredores do Palácio Alvorada, no local que ficou conhecido por “cercadinho”, com falas consideradas discriminatórias.
A ação foi uma iniciativa da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão no RS, assinada por Enrico Rodrigues de Freitas e Ana Paula Carvalho de Medeiros, em parceria com o procurador da República Marco Antonio Delfino de Almeida, do Mato Grosso do Sul e especialista na matéria. A ação também foi assinada por defensores públicos federais.
As ofensas foram proferidas nos dias 4 e 6 de maio e 8 de julho. Ainda no mesmo dia 8, no programa “Live do Presidente” nas redes sociais, Bolsonaro reforçou as manifestações de cunho racista.
Para os procuradores da República, as falas do ex-presidente acabam por desumanizar as pessoas negras mediante a associação de suas características raciais através do estereótipo de ligar a ideia de cabelos de pessoas negras à sujeira.
Os autores da ação alegam, ainda, que as falas racistas são agravadas, como dispõem a lei penal, pela circunstância de serem realizadas com o “intuito de descontração, diversão ou recreação”. A incorrer em tal discurso, o ex-presidente praticou o que se conhece como racismo recreativo.
Após decisão da 10ª Vara Federal que julgou improcedente a ação, por considerar que as falas se referiam a um único indivíduo, não tendo ocorrido lesão de natureza coletiva, MPF e DPU apresentaram recurso ao TRF4, que acolheu a argumentação da ação civil pública.
Apelação – O MPF e a DPU apelaram ao TRF4 sustentando que as condutas do ex-presidente extrapolariam os limites da ofensa individual e específica ao cidadão, com discurso que configurou ofensa, discriminação e intolerância a qualquer pessoa negra. Apontaram ainda violação a preceitos constitucionais e transgressão a termos de tratados e convenções dos quais o Brasil é aderente.
Segundo o recurso, as posturas discriminatórias adotadas pelo então presidente, além de demonstrarem “descompromisso com os valores constitucionais”, causaram “lesão à dignidade e à honra da população negra”.
O procurador regional da República Paulo Leivas, que atuou na Turma do TRF4, afirmou que a manifestação do ex-presidente deve ser entendida como racismo recreativo e “contribui para o aumento do preconceito ao reforçar estereótipos negativos sobre o cabelo de pessoas negras.”
Retratação – A condenação também determina que Bolsonaro faça uma retratação pública dirigida à população negra em relação ao conteúdo discriminatório de suas falas, por meio de veículos de imprensa de abrangência nacional e em suas redes sociais.
O valor, de R$ 1 milhão a ser corrigido com juros e correção monetária desde a data do fato, será revertido ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), que é um fundo público destinado a financiar projetos de reparação, prevenção e fiscalização de danos causados a direitos difusos e coletivos.
*Com informações do MPF
Leia mais: Bolsonaro é diagnosticado com câncer de pele em estágio inicial; Médicos descartam risco grave