O Ministério Público Federal (MPF) instaurou um procedimento administrativo para acompanhar a investigação de uma suposta invasão por garimpeiros à Aldeia Jarinal, localizada na Terra Indígena Vale do Javari, no Amazonas. Segundo denúncia recebida pela Procuradoria da República no município de Tabatinga, os invasores teriam utilizado ameaças de morte e coação contra os indígenas aldeados.
A medida foi formalizada por meio da Portaria nº 23/2025, assinada pelo procurador da República Gustavo Galvão Borner e publicada no Diário Oficial na segunda-feira, 28 de julho. O procedimento tem como objetivo fiscalizar a instauração de inquérito policial requisitado na Notícia de Fato nº 1.13.000.000819/2025-20.
“[O procedimento tem o] objetivo de acompanhar a instauração de inquérito policial requisitado sobre a notícia de suposta invasão por garimpeiros à Aldeia Jarinal, localizada na Terra Indígena Vale do Javari, com a utilização de coação e ameaças de morte aos aldeados”, diz trecho do documento.
De acordo com o MPF, a instauração do procedimento atende às funções institucionais do órgão, que incluem a proteção de interesses sociais e individuais indisponíveis, como os direitos dos povos indígenas e a defesa do território tradicionalmente ocupado por eles. A medida também visa garantir o cumprimento dos princípios constitucionais da legalidade, moralidade e probidade administrativa.
A Aldeia Jarinal, onde vivem os povos Kanamari, está situada em uma das regiões mais sensíveis e isoladas do Brasil, o Vale do Javari, território com histórico de conflitos envolvendo exploração ilegal de recursos naturais, especialmente o garimpo. A região também abriga o maior número de povos indígenas isolados do mundo.
O procedimento terá prazo inicial de um ano para conclusão, podendo ser prorrogado. As diligências iniciais foram determinadas no despacho PRM-TAB-AM-00009140/2025 e serão acompanhadas pela 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, que trata de populações indígenas e comunidades tradicionais.
O MPF ressaltou que o uso do Procedimento Administrativo, conforme previsto na Resolução nº 174/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público, permite o monitoramento de políticas públicas e investigações que envolvam direitos coletivos sensíveis, mesmo sem a instauração imediata de inquérito civil.
A Procuradoria, contudo, não divulgou detalhes sobre os responsáveis pelas ameaças ou o estado atual de segurança dos indígenas da Aldeia Jarinal.
A reportagem entrou em contato com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) para obter posicionamento sobre o caso, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.
Garimpo
Vale lembrar que o garimpo ilegal tem sido uma pauta recorrente na Amazônia, especialmente, em territórios isolados como o Vale do Javari. Segundo mostrou O Convergente no início de julho, MPF chegou a firmar um Termo de Compromisso pioneiro com a Starlink para prevenir e combater o uso irregular de internet em áreas de garimpo ilegal na região.
Esse foi o primeiro acordo formal da empresa com autoridades brasileiras. A iniciativa estabelece medidas concretas de rastreabilidade, controle e bloqueio de usuários que utilizam o serviço da empresa para viabilizar atividades criminosas em áreas sensíveis da floresta, especialmente em terras indígenas e unidades de conservação.
Pelo acordo, a Starlink exigirá, a partir de janeiro de 2026, dados de identificação e comprovante de residência dos novos usuários como condição para ativação dos terminais na região da Amazônia Legal. A medida permitirá que as autoridades brasileiras monitorem com maior precisão o uso dos equipamentos.
Veja também: Acordo entre MPF e Starlink prevê coibir uso da internet no garimpo ilegal
Internet
A medida ocorreu após uma investigação, conduzida pelo MPF no Amazonas, revelar que quase todos os pontos de garimpo ilegal na Amazônia contam com acesso à internet via satélite fornecida pela Starlink, empresa do bilionário Elon Musk e pertencente à SpaceX. Segundo denúncias, o uso da tecnologia tem permitido a comunicação entre garimpeiros, favorecendo atividades criminosas como a exploração ilegal de minérios em áreas protegidas, especialmente terras indígenas.
Veja também: Investigação aponta que quase todos os pontos de garimpo ilegal na Amazônia possuem internet Starlink
A presença da internet Starlink em garimpos ilegais é considerada um fator que dificulta as ações repressivas das autoridades. Segundo o MPF, os garimpeiros estão utilizando o serviço para articular fugas, planejar contrainteligência criminosa e ocultar provas. O acesso à internet tem viabilizado também a rápida disseminação de informações, como a movimentação de equipes de fiscalização, impactando negativamente a preservação ambiental e a segurança das comunidades indígenas.
Confira o documento:
Por: Bruno Pacheco
Foto: José Rosha, do Cimi Norte I
Revisão Jurídica: Letícia Barbosa