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sexta-feira, julho 5, 2024

Após caso denunciado por Yara Lins, auditoria do TCU emite nota sobre cooperação com o TCE-AM

É necessário que os Tribunais de Contas do Brasil expressem compromisso com tais práticas civilizatórias no exercício do controle externo

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A Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AudTCU), com apoio da Comissão AudTCU Mulheres, vem a público desagravar a Presidente do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, Conselheira Yara Amazônia Lins Rodrigues dos Santos, covardemente agredida com palavras chulas e de baixo calão que lhe foram desferidas por um de seus pares, durante a sessão plenária que a elegeu Presidente da Corte de Contas, em 3 de outubro de 2023.

Tamanha a gravidade da violência, no dia 6 de outubro, a Senadora Soraya Thronicke (MS) levou ao conhecimento do Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, a denúncia que a Presidente eleita do TCE-AM formalizou na Delegacia-Geral de Polícia do Estado do Amazonas contra um dos Conselheiros, a quem acusou por injúria e ameaça, conforme amplamente divulgado na imprensa.

Em protesto na porta do TCE-AM, um grupo de mulheres pediu o afastamento do Conselheiro acusado de agredir a Presidente eleita. A Desembargadora Maria das Graças Figueiredo, Ouvidora da Mulher no Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, chamou a atenção para a violência contra mulheres que deve ser combatida, independentemente, de classe social ou ambiente em que ocorra. A violência de gênero perpetrada no Plenário do TCE-AM também repercutiu negativamente no Congresso Nacional e o Deputado Federal Fernando José de Souza Marangoni (SP) fez duras críticas ao agressor, ocasião em que saiu em defesa da Conselheira durante Sessão de Homenagem ao Dia Nacional de Luta Contra Violência à Mulher, em 10 de outubro, em Brasília.

É lamentável que um Tribunal de Contas possa espelhar e, sobretudo, naturalizar violências e opressões de gênero, com episódio claro de misoginia que envergonha todos os Tribunais de Contas do País.

O Conselho Nacional de Justiça tem recomendação para que Magistrados e Magistradas que atuem em Varas Especializadas de Violência possam realizar capacitações em gênero como forma de aprimorar suas atuações (Resolução CNJ nº 79, de 2020). No mesmo sentido, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) recomenda a implementação de projetos de recuperação e reeducação do agressor. Tais recomendações se acham em sintonia com a Recomendação Geral no 35 do Comitê para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) – Convenção Internacional pela Eliminação de todas as formas de Discriminação e Violência à Mulher da ONU.

É necessário que os Tribunais de Contas do Brasil expressem compromisso com tais práticas civilizatórias no exercício do controle externo. Enquanto isso não acontecer, os  Magistrados de Contas não se demonstram à altura do regime jurídico-constitucional que lhes assegura as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens assegurados dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça e Desembargadores do Poder Judiciário (art. 73, § 3º).

Vale lembrar que, consoante o Código de Ética da Magistratura, o exercício da função de inegável envergadura exige conduta compatível com os preceitos do referido Código e do Estatuto da Magistratura, cujos agentes de Estado devem se nortear pelos princípios da “independência, da imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro”. Nesse contexto, o Código de Ética impõe ao Magistrado o dever de cortesia com seus pares, membros do Ministério Público, Servidores, Advogados,  exigindo “a utilização de linguagem escorreita, polida, respeitosa e compreensível”. Na verdade, trata-se de deveres universais que pautam as relações minimamente civilizadas, de modo que atentar contra esses princípios da Magistratura deve ser repudiado por todos que integram os Tribunais de Contas do Brasil.

Esse dever não se limita a tratativas interpessoais. Dados do Relatório do CNJ “O Poder Judiciário na Aplicação da Lei Maria da Penha: ano 2022” revelam um Brasil violento, que enfrenta desafios no combate à violência doméstica e familiar e/ou feminicídio, com ingresso de 640.867 processos desse tipo.

O Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, com 4,14 milhões de habitantes, recebeu 15.380 novos processos de violência contra mulher/feminicídio apenas em 2022 e possui 35.377 processos pendentes. Considerado o número de novos processos em 2022, o Estado do Amazonas ocupa a 16ª posição no ranking e a 13ª posição quando esse número é comparado com a população do Estado.

No geral, as estatísticas demonstram que os índices de violência contra mulheres e o feminicídio vêm aumentando. A contenção desse terrível fenômeno passa, também, pelo compromisso com ações de controle externo voltadas para a avaliação da eficiência e da eficácia de políticas públicas de combate à violência contra mulher.

Não é aceitável que agentes de Estado, notadamente aqueles que exercem funções decisórias no mais alto escalão da estrutura de poder, banalizem o mal que condutas de violências contra à mulher acarretam. O tratamento violento dispensado à Conselheira, com palavras vulgares, chulas e de baixo calão durante a sessão plenária que a elegeu para ocupar o mais alto posto de líder da instituição, não é conduta que se compatibilize com a noção jurídica de decoro, tampouco dignifica a função de Conselheiro atentar contra a honra e a dignidade de um de seus pares com violência misógina e odiosa.

Enquanto tais práticas reiteradas de violências institucionais na dimensão de gênero não forem reconhecidas como graves violações aos Direitos Humanos, as instituições que deveriam promover a efetividade de políticas públicas de proteção aos direitos das mulheres se colocarão como verdadeiras algozes, as maiores violadoras dos direitos humanos das mulheres na sociedade brasileira. É necessário e urgente a mudança de comportamentos diante de casos como esses para que a luta de tantas mulheres em busca de igualdade, de direitos não seja em vão.

Diante da gravidade dos fatos veiculados, que recebeu o devido repúdio de Parlamentares do Congresso Nacional, a AudTCU, além de repudiar a conduta violenta do agressor, pugna para que o Tribunal de Contas da União se abstenha de realizar qualquer ação de cooperação com o TCE-AM no campo do controle externo, enquanto as medidas disciplinares e de investigação nas esferas competentes estiverem em curso, de forma a prevenir qualquer abalo que a associação da imagem de relatores com esse tipo de conduta possa acarretar aos processos de controle externo sobre matéria de competência do TCU.

Leia mais: Presidente eleita do TCE-AM Yara Lins denuncia ameaças de conselheiro antes da eleição

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Da Redação

Foto: Divulgação

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