Em situação de emergência por causa da cheia, o município de Manicoré (a 332 quilômetros de Manaus) vai gastar cerca de R$ 1 milhão com a compra de cinco veículos utilitários, tipo pick-up, cor branca. Os carros, segundo o contrato firmado por meio de licitação, serão usados “para atender as necessidades do município de Manicoré”.
Na justificativa da compra, a prefeitura diz ser imprescindível a aquisição dos veículos já que ao longo do ano o município vem se destacando com diversos trabalhos. No trecho do contrato, relacionado ao processo de licitação, a prefeitura diz “que necessita de maneira urgente da aquisição dos carros supracitados, devido à grande extensão de estradas e vicinais, que no decorrer do ano, precisa-se atender periodicamente as comunidades com os serviços e diversos eventos realizados pelas Equipes das Secretariais Municipais”.
Conforme informações descritas no despacho de homologação e adjudicação PP. 038/2021 – CPL/PMM, a compra dos veículos vai custar R$ 994.500,00 (novecentos e noventa e quatro mil e quinhentos reais). A fornecedora dos carros e vencedora da licitação foi a empresa GB Manaus Autocenter LTDA, localizada na capital do Estado.
O despacho de homologação, assinado pelo prefeito Lúcio Flávio do Rosário (PSD) e publicado no Diário Oficial dos Municípios, no início de junho, não detalha o modelo dos veículos e nem a quantidade, mas determina que sejam na cor branca. As informações estão descritas apenas no contrato disponível no Portal da Transparência.
Pela descrição os cinco veículos têm especificidades diferenciadas. Segundo o contrato, os carros devem ser do “tipo carro popular, pick-up ou similar, 4 Portas – 85 CV/75CV” com ar condicionado e direção hidráulica, sendo modelo 2021 ou versão mais atualizada na cor branca e com capacidade para no mínimo cinco passageiros.
Os valores individuais não são detalhados no contrato, porém conforme pesquisa de mercado, o custo de um carro modelo pick-up custa, em média, R$ 200 mil.
Reclamação – O gasto foi considerado desnecessário por alguns moradores de Manicoré, principalmente em um período de cheia e pandemia. Para moradores entrevistados pelo portal O Convergente, o valor seria melhor aplicado se fosse investido em ações que resultassem em melhorias na cidade.
“Poderia investir em outras coisas de mais necessidade para o município. Como o sistema viário da cidade, que está cada vez pior, não tem uma rua que você não tenha que desviar dos buracos. Fora a orla da nossa cidade que não existe, devido ao fenômeno de terra caída, que já afetou a primeira rua da cidade”, opinou o morador que preferiu não se identificar.
A situação é complicada na opinião de outro morador, que optou por não ter o nome revelado com medo de represália. “Se o prefeito for comprar mesmo, eu não concordaria. Mesmo porque nossa cidade não necessita de carros e sim de infraestrutura, asfalto. Nossa cidade está com a maioria das ruas todas esburacadas, ruas intransitáveis. Poderia aplicar esse recurso em remédio que nos postos de saúde aqui não tem ou até mesmo em médicos especialista que nós tínhamos em nossa cidade, no mandato passado, e hoje não temos mais. É um absurdo se isso vier acontecer, é lamentável”.
Veja imagens de algumas ruas do município:
Situação piora quando chove:
Suspeitos – Os atos praticados pela Prefeitura de Manicoré, na gestão do prefeito Lúcio Flávio, estão na mira do Ministério Público do Amazonas (MPE-AM). Isso porque, no final do mês passado, a Promotoria de Justiça de Manicoré recomendou que a prefeitura suspendesse os atos referentes a um processo licitatório que visava a compra de material esportivo destinado à Secretaria Municipal de Juventude, Desporto e Lazer da cidade.
A recomendação foi feita após o MPE identificar uma série de irregularidades e ilegalidades no procedimento administrativo para a compra.
“Entre as principais irregularidades encontradas, temos o possível sobrepreço na previsão dos valores constantes na planilha de especificações e quantidades do Pregão, segundo pesquisa dos preços correntes no mercado, o que afronta os princípios da legalidade, moralidade administrativa, boa-fé e probidade, além da ausência de publicação do edital e demais documentos iniciais no Portal da Transparência e site da Prefeitura do Município de Manicoré”, explicou o promotor de justiça Vinícius Ribeiro de Souza na época da decisão.
Resposta – O portal O Convergente entrou em contato com a Prefeitura de Manicoré questionando a necessidade da compra dos veículos e porque o valor não foi investido em ações de enfrentamento à cheia ou da pandemia, mas até o fechamento da reportagem não teve retorno.
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Por Izabel Guedes
Fotos: Divulgação / Ilustração: Marcus Reis