Um esquema conhecido como “maquiagem fiscal” na Zona Franca de Manaus (ZFM), com operações inexistentes para não pagar impostos, pode ter gerado um rombo superior a R$ 70 milhões aos cofres públicos, segundo estimativas de especialistas. O caso fez a Secretaria de Estado da Fazenda do Amazonas (Sefaz-AM) descredenciar dezenas de empresas acusadas de supostas irregularidades fiscais envolvendo a declaração de impostos de alíquotas (DIA).
Segundo a Sefaz-AM, a suspeita de emissões irregulares da DIA surgiu em operações de empresas que comercializam ferro e aço, com produtos que, mesmo descritos como insumos, chegavam para serem revendidos diretamente para o consumidor final. A prática é chamada de “maquiagem fiscal”, quando ocorre fornecimento de dados incorretos a fim de favorecer um dos lados da operação.
Veja também: Esquema de tráfico de drogas em estacionamento de órgãos públicos é desarticulado em Brasília
A Sefaz-AM tornou o caso público na última segunda-feira e informou que, em 2024, tornou mais rigoroso os controles de emissão da Declaração de Ingresso no Amazonas, o DIA, e que, ao passar um “pente fino” sobre os documentos eletrônicos, constatou inconsistências em declarações de diversas empresas.
O episódio levou a secretaria a descredenciar pelo menos 626 empresas (inscrições estaduais) pelas irregularidades que resultou ao não recolhimento de impostos, que deveriam ter sido pagos pelos empreendimentos.
De acordo com a Sefaz-AM, desde 2012, por meio do Decreto nº 32.128, os contribuintes que se credenciaram junto à instituição são obrigados a informar à secretaria, por meio da DIA, as operações ou prestações sujeitas ao desembaraço fiscal de entrada. A Sefaz explicou ainda que, no caso de insumos direcionados para empresas instaladas na Zona Franca de Manaus, a operação é isenta da cobrança do ICMS.
Mesmo com a Sefaz adotando a declaração espontânea por parte do contribuinte para acelerar o processo de liberação das cargas, o sistema da autarquia começou a apresentar alto volume de liberações sem o devido recolhimento dos impostos.
“O insumo, a matéria-prima para a confecção do produto final, é isento, mas a produto acabado não. Constatamos que algumas empresas estão adquirindo a mercadoria pronta, que era revendida para o consumidor, sem recolher nada para o estado. A perda para o estado está estimada em mais de R$ 70 milhões”, explicou Andrea Corado, chefe do Departamento de Controle de Entrada de Mercadoria (Decem).
Segundo a Sefaz-AM, os contribuintes tiveram direito a um prazo para prestarem esclarecimento. Todavia, não houve manifestação por parte dos envolvidos, motivo que levou a secretaria a descredenciar as empresas.
Desvio de finalidade e concorrência desleal
Ao portal O Convergente, a economista Denise Kassama, membro do Conselho Federal de Economia (Cofecon), explicou sobre o desvio de finalidade e a concorrência desleal ocasionada com o esquema de maquiagem fiscal.
Segundo a especialista, qualquer empresa pode fazer projetos e submetê-los para serem aprovados na ZFM e ter o direito ao incentivo fiscal oferecido às indústrias instaladas na região. “A ideia é que a indústria gere empregos, renda na economia, densamento de cadeias produtivas e faça a economia crescer”, destacou.
Denise lembra que o comércio é uma atividade de serviço e quando a empresa comete irregularidade envolvendo a declaração de impostos de alíquotas (DIA), há ainda uma concorrência desleal.
Veja também: Especialistas analisam pautas que devem ser foco do G20 no Brasil
“Além de importar sem pagar os impostos, ele vai ter um custo menor no produto, conseguindo vender a um preço mais barato que o concorrente que fez tudo certo. Além de ser um desvio de finalidade, é uma grande sonegação e uma concorrência desleal”, frisou.
A economista continuou: “Perde o Estado, de certa forma. A economia é prejudicada, porque há um desvio de arrecadação, que é a forma que os governos têm de lucrar dinheiro e fazer políticas públicas. Há um desvio de finalidade, porque as empresas não vão cumprir o que se comprometeram ao aprovar um projeto de incentivo fiscal junto ao governo do Estado; e principalmente, há um prejuízo para o mercado, pois o comerciante que faz tudo certo, recolhe os impostos, assina a carteira, está concorrendo com alguém que não faz isso e não paga os impostos”, concluiu.
Outro lado
O Convergente entrou em contato com a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), a autarquia que administra a Zona Franca de Manaus (ZFM), e solicitou um posicionamento sobre o rombo de R$ 70 milhões.
A reportagem questionou ainda quais medidas a Suframa adotou para garantir a atuação regular das empresas instaladas na ZFM. Até a publicação da matéria, sem retorno.
Por: Bruno Pacheco, com informações da Sefaz-AM
Foto: Afebras
Revisão jurídica: Letícia Barbosa