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terça-feira, julho 29, 2025

Brasil e Amazonas enfrentam alta no feminicídio e reforçam alerta nacional

Por trás dessas estatísticas, há histórias interrompidas, filhos órfãos, lares destruídos e vidas marcadas para sempre

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Enquanto o Brasil tentava se equilibrar entre tantas crises, um dado crescia silenciosamente, ano após ano, deixando um rastro de dor que poucas manchetes conseguem traduzir. Em 2024, 1.463 mulheres foram mortas apenas por serem mulheres. O número representa um aumento de 2,6% em relação a 2023, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). No Amazonas, o aumento foi ainda mais expressivo: 18,5%, de 27 para 32 casos.

Por trás dessas estatísticas, há histórias interrompidas, filhos órfãos, lares destruídos e vidas marcadas para sempre. E há também quem tenta entender essa realidade, como o epidemiologista Jesem Orellana, da Fiocruz Amazônia, que dedicou os últimos anos a estudar os padrões dessa violência letal na região Norte do país.

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No estudo intitulado “Epidemiologia do Feminicídio na Amazônia Brasileira” (Fiocruz/2024), Orellana e sua equipe descreveram, com precisão incômoda, como o feminicídio se expressa em territórios onde o isolamento geográfico, o racismo estrutural e a desigualdade social se combinam de forma perversa. “As mulheres negras, indígenas e de baixa renda continuam sendo as principais vítimas. O Estado ainda falha em protegê-las”, escreveu Orellana em artigo publicado na revista Saúde e Sociedade, da Fiocruz.

As palavras do pesquisador são sustentadas por dados concretos. No Amazonas, por exemplo, a maioria das vítimas tinha entre 18 e 35 anos. Mais de 80% das mortes ocorreram dentro de casa, e em mais da metade dos casos já havia denúncias prévias de ameaças ou agressões. “O feminicídio é, quase sempre, o desfecho de uma escalada que poderia ter sido evitada”, observa Orellana.

Veja também: Lei que amplia para até 40 anos a pena para casos de feminicídio é sancionada

Nas delegacias especializadas de Manaus, o cotidiano confirma as estatísticas. A delegada Débora Mafra, atualmente aposentada, atuou na DECCM (Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher) da Zona Centro-Sul, e compartilhou em entrevista concedida ao site O Convergente a realidade que via de perto. “A vítima, muitas vezes, pede ajuda. Mas o medo, a dependência financeira e a ausência de apoio efetivo a impedem de romper o ciclo da violência. Quando ela morre, quase sempre havia sinais que ninguém quis ver”, disse.

Mafra, que atuou há mais de uma década na proteção de mulheres, revelou que em 7 de cada 10 casos de feminicídio que chegaram à sua unidade, o autor era companheiro ou ex-companheiro da vítima. A maioria das agressões começou com xingamentos e ameaças. Poucas foram levadas a sério até que fosse tarde demais.

O Brasil tem leis avançadas, como a Lei Maria da Penha e a tipificação do feminicídio no Código Penal, mas isso não tem sido suficiente. “A prevenção é falha. Faltam abrigos, faltam medidas protetivas efetivas, faltam agentes para fiscalizar e acolher essas mulheres antes da tragédia”, afirmou a delegada Juliana Tuma, titular da DECCM Norte, em entrevista ao site G1 Amazonas (abril de 2024).

O pesquisador Jesem Orellana aponta o mesmo caminho: educação, acolhimento, punição e investimento em políticas públicas permanentes. “Não adianta fazer campanha só no 8 de março ou no agosto lilás. O feminicídio é uma epidemia, e precisa ser tratado como tal, com recursos e vontade política”, defende no estudo da Fiocruz.

Onde buscar ajuda em Manaus

Em meio à dor, existem caminhos possíveis para interromper o ciclo da violência. Em Manaus, duas delegacias especializadas acolhem denúncias e orientam as vítimas:

📍 Delegacia da Mulher – Centro-Sul
Av. Mário Ypiranga, 3.900 – Parque 10.

📍 Delegacia da Mulher – Zona Norte
Rua A, Conj. Galiléia – Cidade Nova.

Além disso, denúncias podem ser feitas por telefone:

📞 180 – Central de Atendimento à Mulher (24h)
📞 190 – Polícia Militar (emergência)
📞 181 – Disque Denúncia da SSP-AM
📱 WhatsApp Denúncia: (92) 99265-7992

Um problema de todos nós

O feminicídio não é apenas um problema de segurança. É um problema social, estrutural e cultural. Como lembra a delegada Débora Mafra, “toda mulher morta já havia sido ferida antes — no corpo, na alma, na dignidade”. E como reforça o pesquisador Jesem Orellana, não é a mulher que precisa se proteger — é o Estado que precisa agir.

Enquanto a sociedade não entender isso, os números seguirão crescendo. E atrás de cada número, mais uma vida deixará de existir.

(Crédito da imagem: Imagem gerada por inteligência artificial (IA) por meio da funcionalidade de criação de imagens do ChatGPT, ferramenta desenvolvida pela OpenAI)

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