A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Resolução 32/24, da Mesa Diretora, que permite a este órgão propor a suspensão, por medida cautelar, do mandato de deputado federal por até seis meses. Essa decisão deverá ser deliberada pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar em até três dias úteis com prioridade sobre demais deliberações. O texto já foi promulgado como Resolução 11/24.
Segundo a Mesa Diretora, o projeto pretende prevenir “a ocorrência de confrontos desproporcionalmente acirrados entre parlamentares”. Os episódios de confusão nas comissões têm acontecido com frequência. Na semana passada, os deputados André Janones (Avante-MG) e Nikolas Ferreira (PL-MG) após o Conselho de ética decidir pelo arquivamento da denúncia contra Janones. No mesmo dia, mais tarde, a deputada Luiza Erundina (Psol-SP) passou mal após discussões na Comissão de Direitos Humanos e Minorias.
Inicialmente, o projeto autorizava a Mesa a suspender liminarmente o mandato, mas depois de negociações no dia de hoje entre os partidos, o substitutivo do relator, deputado Domingos Neto (PSD-CE), prevê a proposta de suspensão a ser decidida, em última instância, pelo Plenário.
De acordo com o texto, essa suspensão poderá ser aplicada a deputado contra o qual seja apresentada representação de autoria da Mesa por quebra de decoro parlamentar.
A Mesa Diretora terá prazo de cinco dias úteis, “contados do conhecimento do fato que ensejou a representação”, para oferecer ou não a proposta de suspensão do mandato. Esse prazo é decadencial, ou seja, se ultrapassado, a decisão não poderá mais ser tomada.
Para Domingos Neto, a proposta é oportuna e necessária para o bom funcionamento da Câmara dos Deputados. “Tendo em vista os graves acontecimentos recentes, envolvendo insultos, ameaças, agressões físicas e verbais, incompatíveis com um ambiente democrático e com a urbanidade, a ética e o decoro”, afirmou o deputado, que é corregedor da Câmara.
Domingos Neto disse que muitos deputados questionaram sobre a dosimetria para a suspensão parlamentar. “Não estamos entrando na área do Código de Ética. O que cabe para suspender um parlamentar está no código desde 2001”, explicou.
Novas regras
Para evitar decisão unilateral do presidente da Câmara sobre esse tema, como permitido em outras matérias de competência da Mesa Diretora, o projeto exclui essa possibilidade no Regimento Interno da Casa. Assim, somente a Mesa poderá decidir.
Conforme previsto no Código de Ética (Resolução 25/01), o conselho decidirá pela suspensão em votação nominal e por maioria absoluta.
Recurso
Em vez do previsto no código atual, de permissão de recurso do parlamentar à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) contra a decisão do conselho em seu prejuízo (suspender o mandato), a nova redação para esse processo mais rápido permite a ele recorrer diretamente ao Plenário.
Se o Conselho de Ética decidir contra a suspensão do mandato, somente a Mesa poderá apresentar recurso ao Plenário. No texto original, isso seria possível em pedido de 1/10 (52) dos deputados ou líderes que representem esse número no exercício do mandato.
A decisão do Plenário deverá ser tomada por votação ostensiva, com a necessidade do voto da maioria absoluta para suspender o mandato.
Caso o Conselho de Ética não decidir nos três dias úteis, a proposta de suspensão do mandato será enviada pela Mesa diretamente ao Plenário, que deverá votar o assunto com prioridade sobre todas as demais deliberações na sessão imediatamente subsequente.
Mais uma vez, mantém-se o quórum de maioria absoluta para ser aprovada a suspensão do exercício do mandato.
Rito célere
Apesar da mudança, o projeto não define prazos, dentro dos três dias úteis, para que o acusado ofereça sua defesa e o relator apresente parecer, dentre outros detalhes do processo de ampla defesa.
No Código de Ética atual, por exemplo, se o recurso à CCJ versar sobre atos do conselho que o recorrente considere ter contrariado norma constitucional, regimental ou do código, ele terá efeito suspensivo.
O projeto não especifica ainda sobre condições de revogação da medida cautelar, já que sua natureza jurídica não é permanente.
Presidentes de comissão
Outra mudança no Regimento Interno feita pelo projeto é a permissão para que os presidentes de comissão e do Conselho de Ética adotem, no respectivo colegiado, as mesmas prerrogativas atribuídas ao presidente da Câmara dos Deputados para manter a ordem nas sessões do Plenário.
Assim, por exemplo, os presidentes desses colegiados, conforme a situação, poderão adotar as seguintes medidas:
- determinar que só deputados e senadores tenham assento no colegiado;
- não permitir conversação que perturbe a leitura de documento, chamada para votação, comunicações, discursos e debates;
- a nenhum deputado será permitido falar sem pedir a palavra e sem que o presidente a conceda, e somente após essa concessão a taquigrafia iniciará o apanhamento do discurso;
- se o deputado pretender falar antirregimentalmente, o presidente lhe dará uma advertência e, se insistir em falar, dará o seu discurso por terminado;
- sempre que o presidente der por terminado o discurso, os taquígrafos deixarão de registrá-lo;
- se o deputado perturbar a ordem ou o andamento regimental da sessão, o presidente poderá censurá-lo oralmente ou, conforme a gravidade, promover a aplicação de sanções previstas no Regimento Interno;
- nenhum deputado poderá se referir de forma descortês ou injuriosa a membros do Legislativo ou dos demais Poderes da República;
- não será permitido interromper o orador, salvo concessão especial deste para levantar questão de ordem ou para aparteá-lo, e no caso de comunicação relevante que o presidente tiver de fazer.
Debate em Plenário
Para o deputado Chico Alencar (Psol-RJ), o ambiente atual na Câmara “é doentio e precisa de um remédio eficaz”, mas avaliou que não é possível um colegiado pequeno como a Mesa Diretora decidir sobre o mandato dos deputados. “Precisamos preservar a sacralidade do mandato popular e a sacralidade da divergência, do dissenso, da oposição forte de ideias e projetos”, disse.
O deputado Alberto Fraga (PL-DF) criticou o fato de a Câmara não ter um instrumento de controle de desvio de conduta. “Tínhamos de avançar para esse tipo de proposta para evitar que os colegas briguem. Os xingamentos e a discordância das ideias vamos respeitar, mas a agressão física fica muito difícil.”
Segundo o deputado Bibo Nunes (PL-RS), o bom senso é fundamental para exercício do mandato na Câmara, mas radicalismo e fanatismo não. “Quem tem medo de punição é o parlamentar que não tem boa conduta e decoro”, declarou.
Já o deputado Hildo Rocha (MDB-MA) defendeu o endurecimento da punição por quebra de decoro. “A maioria dos parlamentares não querem respeitar o decoro, uns por agredir outros, outros até pela vestimenta e outros por fazer malfeitos, até desviando emendas”, disse.
O deputado Tarcísio Motta (Psol-RJ) elogiou a decisão de tirar a responsabilidade pela suspensão do mandato da Mesa Diretora para o Conselho de Ética, após a reunião de líderes na manhã desta quarta-feira (12). “Parte do problema que apresentávamos como central ontem foi resolvido.”
Porém, o deputado Mendonça Filho (União-PE) afirmou que a suspensão do mandato não deveria ser decidida pela Mesa Diretora nem pelo Conselho de Ética, mas apenas pelo Plenário.
O deputado Glauber Braga (Psol-RJ) disse que houve uma “redução de danos” entre a proposta original e a nova versão feita após a reunião de líderes, mas ainda assim considerou que o texto não deveria ser aprovado. “Em um quadro que a gente tem ampliação de poderes para deliberação sumária de suspensão de mandato, os mais prejudicados são os parlamentares da esquerda. Não são os que vão articular acordos com o presidente para sua salvação”, afirmou.
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Fonte: Agência Câmara de Notícias
Foto: Divulgação / Mário Agra / Câmara dos Deputados
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