Um grupo de parlamentares de Boca do Acre denunciou ao Portal O Convergente um ato da Prefeitura de Boca do Acre, realizado em abril, que decretou “Situação de Emergência” no município, devido à subida do nível das águas dos rios Acre e Purus que banham a cidade. O decreto de emergência foi publicado no Diário Oficial dos Municípios do dia 4 de abril, após decreto de alerta de cheia, feito em março.
A denúncia foi encaminhada ao O Convergente pelos vereadores da Câmara Municipal de Boca do Acre, entre eles: a presidente da Câmara, vereadora Taísa Onofre (PP); Jansen Almeida (Avante); Wilkerson Roderick (PSC); Ana Maria de Queiroz (Avante); Edmilson Furtado (Cidadania); Simone de Souza (PP) e Isabelle Oriá (MDB).
Segundo as denúncias, feitas ao longo do mês de maio na Câmara de Vereadores e pelas redes sociais dos parlamentares, a cidade não está em situação emergencial e poucas famílias foram realocadas por conta da subida das águas e que eles, os parlamentares, consideraram que não seria necessária a decretação de emergência feita pelo prefeito de Boca do Acre, Zeca Cruz (PP).
“Declara Situação de Emergência nas áreas do Município de Boca do Acre, Estado do Amazonas, afetadas pelas inundações – COBRADE nº 1.2.1.0.0, dos rios Acre e Purus, conforme portaria Nº 260/2022”, diz trecho do documento.
Sobre as denúncias
Do grupo de vereadores denunciantes, o Portal O Convergente ouviu dois deles que afirmam não ter havido uma cheia severa como nos anos anteriores e que, até a presente data, o município não foi tão afetado pela subida das águas dos dois rios que banham Boca do Acre. Entre os ouvidos, Jansen Almeida, e Taísa Onofre.
O vereador Jansen Almeida considerou como absurda a decretação de emergência, por considerar que não condiz com a atual realidade do município e questionou da tribuna quem passou as informações para uma TV da capital que reproduziu imagens de alagação. Na tribuna da Casa Legislativa, no início de maio, o vereador cobrou providências da Câmara para saber se foi a Defesa Civil Municipal.
“Eu quero solicitar à presidência desta Casa que envie ofício ao Ministério Público para saber quem foi que enviou as imagens da alagação do ano de 2021, que saiu em uma matéria de que Boca do Acre está totalmente alagada. É preciso saber se essas informações foram da Defesa Civil daqui [Boca do Acre] ou se foi da prefeitura, tem que ser responsabilizado, porque isso é um fato grave, é um absurdo. Porque, com essas imagens, com estes conteúdos, a prefeitura pode receber milhões para ser doado à população e todo mundo que está doando apenas cestas básicas, mas que graças a Deus, não foi toda a cidade que está alagada. Infelizmente nós tivemos algumas ruas, principalmente do bairro ali da ‘Praia do Gado’, disse o parlamentar na ocasião.
Emergência e cestas básicas
Já a presidente do Parlamento de Boca do Acre, Taísa Onofre, disse ao O Convergente que encaminhou um documento pedindo informações sobre uma possível licitação de 26 mil cestas básicas feita pela Prefeitura de Boca do Acre baseada na situação de emergência. O documento, segundo ela foi protocolado nesta segunda-feira, 29 de maio.
“Eles aproveitaram essa situação também da enchente, acho que só teve uma casa desabrigada, porque ela fica dentro de uma vala, e ela é a primeira em todos os anos que é retirada, daí já decretaram de cara a situação de emergência e aí eu tenho que apurar, pois foi solicitado 26 mil cestas básicas. Mas se foi entregue umas duas mil foram muitas. Eu estou pedindo informações de cada cesta que foi entregue, os itens dentro da cesta, porque parece que um frango, por exemplo, custou R$ 150, mas a gente tem que ir com bastante cautela e apurar, comentou a parlamentar pontuando que a cheia em Boca do Acre durou menos de um mês e quando uma reportagem mostrando a alagação foi ao ar o município já estava sem inundações”, disse ela.
Pedido de informações
Desde que a denúncia foi encaminhada ao O Convergente, no início de maio, a equipe de reportagem procurou a Prefeitura de Boca do Acre e as demais secretarias para falar sobre o decreto de “Situação de Emergência” por conta da cheia e das ações para atender as famílias abrigadas. No entanto, apenas o secretário da Defesa Civil do município, Jhony Noronha, respondeu parte dos questionamentos pertinentes à sua pasta.
“Eu já lhe adianto que eu já vi essa postagem e eu entendi muito bem a preocupação do parlamentar, só que estas informações que foram passadas nesta na reportagem não foram pelo município. Essas informações são dadas pela Defesa Civil do Estado. Então, tanto nós do município quanto o estado estamos cientes da situação. Nós decretamos sim, Situação de Emergência, porque nós tínhamos índice suficiente para realizar esse pedido de decretação. A gente decreta no município e enviamos ao estado, então eles é que vão homologar ou não o nosso decreto. No caso, a Defesa Civil do Estado homologa e a Defesa Civil Federal reconhece”, disse Johnny Noronha enfatizando que se foi feita a decretação é porque de fato houve essa necessidade.
A Defesa Civil do Amazonas também foi contactada para informar quais são os critérios de avaliação para que um município seja considerado como “Situação de Emergência”, mas não houve retorno.
Nova denúncia
Além de os parlamentares denunciarem a questão da cheia não ter sido tão severa em Boca do Acre, eles também denunciaram uma suposta compra de 26 mil cestas básicas para atender as famílias afetadas pela enchente, em que os valores dos itens possivelmente podem ter sido superfaturados, como citou a presidente da Câmara Taísa Onofre.
Ao surgir esta nova denúncia sobre a suposta compra de 26 mil cestas básicas para atender as famílias afetadas pela cheia, a Prefeitura de Boca do Acre foi acionada novamente, bem como as secretarias de Educação, de Saúde, de Assistência Social, de Administração, de Governo, dentre outras também acionadas para esclarecer sobre essas informações.
A reportagem também procurou a publicação da homologação da compra das cestas básicas pela prefeitura, no Diário Oficial dos Municípios, mas não localizou nenhum documento relativo ao processo licitatório. A busca pela documentação foi realizada no sábado, 27 de maio, às 11h13; Portal da Transparência da Prefeitura de Boca do Acre também foi consultado e, na aba “Licitações”, só consta pasta de procedimentos licitatórios de 2022.
A parlamentar e seus pares acreditam que o decreto de emergência feito pela Prefeitura de Boca do Acre serviu como um “pano de fundo” para a realização de compras e recebimentos de verbas, mas que possivelmente as cestas básicas não foram distribuídas para 26 mil famílias.
Também foram solicitadas informações sobre a não divulgação desta compra, mas novamente não houve retorno das informações solicitadas no prazo estipulado pela reportagem. O espaço segue aberto para esclarecimentos posteriores ou pedidos de direito de resposta.
O Convergente continuará a acompanhar as informações para esclarecer à população os fatos de como o dinheiro público vem sendo gasto na atual gestão do município, bem como na apuração das denúncias encaminhadas à redação.
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Por Edilânea Souza
Fotos: Divulgação / Ilustração: Marcus Reis
Revisão: Vanessa Santos