O prefeito Nathan Macena (Republicanos), de Careiro Castanho (a 86 quilômetros de Manaus), chamou os moradores do município de “macumbeiros” e afirmou que os praticantes da religião são do “satanás”. Para especialistas, o gestor agiu com racismo religioso e de forma criminosa.
A fala do gestor foi disparada durante um comício na comunidade do Araçá, localizada no quilômetro 40, da rodovia federal BR-319, no último 26 de setembro. “Está cheio de macumbeiro no Castanho que é do Satanás”, declarou o prefeito Nathan Macena.
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Segundo a advogada, quilombola e mestre em Direito Constitucional, Luciana Santos, que é da religião de matriz-africana Tambor de Mina, a declaração do prefeito é considerada crime, de acordo com a Lei 14.532/2023, que alterou a Lei 7.716/89, que trata sobre Crime Racial.
“Nessa alteração, está expresso a questão do racismo religioso, porque isso vai além da intolerância religiosa, pois está ligado a esse preconceito relacionado às religiões de matriz-africana. É um tipo de crime que está ligado a essa herança religiosa e cultural africana. E nesses casos de racismo, a pena é de reclusão de 2 a 5 anos”, explicou Luciana Santos.
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A advogada lembra ainda que o Brasil é estado laico e todos podem expressar sua fé e reforça que o racismo é um crime inafiançável, de acordo com a Constituição Federal Brasileira. “É lamentável, saindo da boca de um homem público, que está numa posição de poder”, lamentou.
“Na Constituição diz que o racismo é crime inafiançável e imprescritível. É também um crime de ação penal pública incondicionada, ou seja, é obrigatório que as autoridades, ao tomarem conhecimento, investiguem”, salientou.
Herança
Especialista em Direitos Humanos, a advogada Luciana Santos tem pertencimento étnico no Quilombo e é da religião Tambor de Mina, uma religião com predominância no Maranhão e no Norte do Brasil. Ao Convergente, ela lamentou a postura do prefeito e destacou que o preconceito religioso contra as religiões de matriz-africana tem origem no passado escravocrata.
“Ainda é uma herança do nosso passado escravocrata, permeado por essa visão que se tinha na época em que tudo que não era europeu, era atrasado. Isso incluía as questões das religiões e, como o racismo está baseado em relações de poder, dominação, era preciso cunhar essas religiões de ‘alto demoníaco’, para ter uma justificativa para que aqueles povos pudessem ser escravizados”, lembrou Luciana Santos.
O preconceito, continua a advogada, persiste ainda até a contemporaneidade. “Persiste, até hoje, porque o racismo não acabou. Essas relações de poder não acabaram e então ela vai se perpetuando. Isso inclui a questão do racismo religioso, por isso que é racismo religioso o caso [do prefeito], não intolerância religiosa”, concluiu.
Outro lado
O Convergente entrou em contato com o prefeito Nathan Macena, por meio do e-mail disponibilizado pelas redes sociais do gestor ([email protected]), solicitando um posicionamento sobre o caso. Até a publicação da reportagem, sem retorno.
Polícia
O Convergente também entrou em contato com a Polícia Civil do Amazonas (PC-AM), solicitando informações se o caso deve ser investigado e quais as providências a serem tomadas contra o gestor.
Por: Bruno Pacheco
Ilustração: Marcus Reis
Revisão: Letícia Barbosa