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sábado, novembro 23, 2024

A luta pela democracia e pelo acesso à educação são as principais pautas da presidente da UNE, a amazonense Bruna Brelaz

Ao Portal O Convergente, Bruna Brelaz falou de sua trajetória até chegar ao posto máximo da UNE, das lutas pela educação no país, das articulações com partidos de centro pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro, dos ataques nas redes sociais e das organizações de grandes manifestações populares pela democracia

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A amazonense e estudante de Direito, Bruna Chaves Brelaz, 26, tornou-se a primeira mulher negra e nortista eleita presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), o mais importante espaço do movimento estudantil brasileiro e de lutas sociais. À frente da entidade, Bruna vem se destacando nas mobilizações e articulações políticas pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e pela luta contra os cortes no orçamento para Educação.

Para Bruna estar à frente da UNE é mais do que um desafio, é sinônimo de transformação, é a oportunidade de ampliar vozes de mulheres, negros e pobres em políticas educacionais para cerca de oito milhões de universitários de todos os 26 Estados e do Distrito Federal.

Em entrevista exclusiva ao Portal O Convergente, Bruna Brelaz fala da sua trajetória até chegar ao posto máximo da UNE, das lutas pela educação, a importância das articulações com partidos de centro e entidades tradicionalmente divergentes da UNE, com intuito de construir a chamada “frente ampla” pela saída de Bolsonaro da presidência e, consequentemente, dos ataques e ameaças da própria esquerda nas redes sociais, além das organizações de grandes manifestações populares em prol da democracia.

Ex-aluna do Instituto de Educação (IEA) em Manaus, Bruna Brelaz ingressou na Universidade do Estado do Amazonas (UEA), no curso de pedagogia, por meio das cotas para estudantes de escolas públicas. Filiada à União da Juventude Socialista (UJS), Bruna presidiu a União Estadual dos Estudantes do Amazonas (UEE-AM). Até chegar à presidência da UNE, Bruna ocupou a diretoria de Relações Institucionais e Tesouraria da entidade.

O Convergente – Como você entrou para esse mundo de mobilização, por meio da política? Como foi a sua trajetória até chegar na UNE?

Bruna Brelaz – Comecei a minha vida no movimento estudantil mobilizando atos contra o aumento da tarifa do transporte público em Manaus. Eu estudava no IEA e o grêmio estudantil da escola bateu na porta da minha sala de aula mobilizando todo mundo para participar desses atos. Logo me identifiquei com essa manifestação porque eu via a dificuldade da minha mãe em garantir ali todo mês o passe-estudantil e isso afetava diretamente o orçamento da minha mãe, que cuidava de mim e da minha irmã sozinha.

A partir daí participei de todos as mobilizações contra o aumento da tarifa de ônibus e isso me abriu uma porta para outros problemas que eu enfrentava, que eu consegui identificar dentro do movimento estudantil. Porque eu percebi que o problema não era somente o aumento da tarifa, o problema era o processo de educação. Ingressei na UEA e já iniciei a minha vida acadêmica também organizando esses estudantes, na mobilização da escolha pela própria universidade do reitor.

Virei diretora do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UEA, e diretora da UEE-AM, sempre muito engajada nesse debate da educação e acreditando muito na perspectiva de um Ensino Superior cada vez mais forte. Esse engajamento me fez ter destaque nacional e ser diretora de relações institucionais da UNE e depois virei tesoureira e agora me torno a primeira mulher negra do Estado do Amazonas a ser presidenta da UNE.

OC – Antes de ser eleita presidente da UNE, você já fazia parte da entidade e ajudou a construir, em março deste ano, a principal campanha dos estudantes na pandemia da Covid-19, o movimento “Vida, Pão, Vacina e Educação”, que viralizou nas redes sociais. No que consistia esse movimento?

BB – A pandemia trouxe exatamente esses anseios, porque dentro da pandemia nós estamos vendo pessoas que estão morrendo por Covid-19, pessoas que estão passando por dificuldade e voltando a passar fome. E há um ataque brutal à educação. Então quando as palavras de ordem “Vida, Pão, Vacina e Educação” foram montadas, elas foram colocadas nessa perspectiva, de que nós não queríamos somente o lockdown, nós não queríamos só o distanciamento, nós queríamos medidas efetivas do Estado para que as pessoas tivessem condições de se proteger do vírus, mas também de todas as mazelas sociais que poderiam vir por conta da economia e de todo processo que nós enfrentamos de dificuldades nesse debate relacionado ao coronavírus.

Essas palavras de ordem foram como um chamado, um recado de que nós não abriríamos mão de nenhum tipo de direito, nem da nossa vida, nem do nosso pão, nem da vacina, que nós ali naquele momento lutávamos para que houvesse, e que não abriríamos mão da educação.

OC – Você foi eleita no dia 18 de julho deste ano e tomou posse ao cargo de presidente da UNE em 25 de agosto, no Congresso Nacional, sendo a primeira mulher negra e do Norte do Brasil a ser escolhida para a presidência da entidade. Como está sendo conduzir a mais importante entidade estudantil da história do país, representando cerca de oito milhões de estudantes universitários do país e quais as principais pautas da UNE nesse período?

BB – A UNE saiu do seu Congresso com alguns desafios. Defender a educação e a democracia são os motes principais dos estudantes para esse próximo período. A gente começou com muita mobilização de rua pelo “Fora Bolsonaro”, que é a nossa pauta principal nesse período e também contra os cortes na educação, contra o contingenciamento que tem acontecido nas universidades brasileiras.

A UNE tem sido a principal articuladora desse processo de ampliação da pauta “Fora Bolsonaro”, principalmente depois do 7 de setembro. Nós temos cumprido um papel importante de dialogar com todos os setores que defendem a democracia e são pela pauta para que haja, de fato, uma situação institucional, política e de mobilização social pelo impeachment do presidente. Então a nossa força, a nossa engrenagem, o nosso fôlego está sendo para construir esse caminho e esse caminho perpassa também por defender a educação, porque ao mesmo tempo que existe uma ameaça à democracia por outro lado existe uma ameaça as universidades, à educação brasileira.

OC – Em um pouco mais de um mês à frente da UNE, você está tendo diálogos com lideranças políticas de centro e, inclusive com movimentos divergentes da UNE, como o Movimento Brasil Livre (MBL). Esteve reunida com Ciro Gomes (PDT), com o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o “FHC”, e no último dia 12 de setembro, esteve em uma mobilização organizada pelo MBL. Qual a razão dessas articulações?

BB – Eu acho que a principal razão da articulação é de fato colocar a mão na massa pelo impeachment do Bolsonaro. Essa articulação perpassa em dialogar com todos os setores, porque esses setores estão no parlamento, os setores que nós divergimos, convergimos, que nós combatemos, eles serão também, de certa forma, responsáveis pela articulação do impeachment e esse processo de convencimento precisa ser feito por alguém que tenha coragem de fazer o chamamento e não ter medo de dialogar com os seus divergentes, exatamente porque nós precisamos garantir o palco democrático, que nos possibilite divergir. É isso que está em jogo e não a MBL contra UNE, e sim a possibilidade de a gente poder divergir, discordar e concordar. É isso que a gente tem defendido e é por isso que nós estamos fazendo essas mobilizações.

Essa reunião que tive com o FHC não significa, por exemplo, que agora a UNE é a favor do neoliberalismo ou da privatização da universidade. Não! A UNE continua sendo a linha de frente da defesa da diversidade e da educação, combatendo ideias que são defendidas pelo FHC e o MBL, mas a UNE concorda que é preciso ter mais engajamento em defesa da democracia e sem esses setores nós não vamos conseguir derrotar Bolsonaro. É simples, é matemática. É isso que eu tenho tentado explicar, porque eu tenho sido atacada por alguns setores. Eu fico muito tranquila em fazer essas movimentações e continuarei fazendo porque acredito que eu tenho que pôr a mão na massa para articular o impeachment do Bolsonaro e não vou me desresponsabilizar disso, muito pelo contrário. Aonde tiver ato, aonde tiver grupo, aonde tiver pessoas que queiram articular fora Bolsonaro nós estaremos dialogando.

OC – Em momentos críticos no Brasil, historicamente, o movimento estudantil se une para realizar mobilizações com intuito de trazer melhorias. E estamos vendo isso na sua gestão à frente da UNE, entretanto, por realizar essas articulações políticas, por manter o diálogo com frentes tradicionalmente divergentes da UNE, você vem sendo criticada e também ameaçada nas redes socais. Como você está lidando com tudo isso?

BB – Eu estou com a consciência tranquila, mas nunca imaginei que a crítica seria tão contundente, que partiria para algum tipo de ameaça e que poderia até ser como misógina, machista. Eu percebo que esse ataque tem sido muito contundente às mulheres que estão se propondo a fazer isso. Eu conversei com a deputada estadual Isa Penna (PSOL-SP), que participou do ato do MBL, as críticas que ela recebeu não foram críticas, foram ameaças misóginas. Eu fiquei muito preocupada quando eu vi figuras que eu discordo bastante, como a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), serem ameaçadas de levarem soco na rua. Eu fiquei muito preocupada quando eu vi uma postagem dizendo que eu merecia apanhar.

Esses ataques são proferidos às mulheres. Eu não vejo esses ataques sendo proferido aos homens que tentam construir a frente ampla. Eu fiz um questionamento em um post, será que existe rede de ódio somente na extrema direita? Será? Eu acho que esse é um questionamento que nós precisamos fazer para esses setores que estão fazendo críticas. Não vamos endossar figuras como José de Abreu só porque é ator, só porque é famoso, só porque é de esquerda, de que está tudo bem. Não está. Isso precisa ser combatido (referência sobre uma mensagem que o ator divulgou recentemente no Twitter atacando a deputada federal Tabata). O debate está sendo feito de forma errada e nós estamos endossando para que figuras que nós criticamos tanto, como Bolsonaro, se fortaleçam, porque quem faz esse debate foi o bolsonarismo.

Esse é o debate: a gente quer Bolsonaro em 2022 forte? Por isso que nós queremos tirar Bolsonaro agora! Se existir algum setor que defenda que Bolsonaro precisa estar em 2022, precisa falar e ser sincero com a sociedade. Não adianta ficar dizendo “fora Bolsonaro, fora Bolsonaro” e não colocar a mão na massa. Essa crítica eu faço também a quem está batalhando todo dia para conversar com todo mundo e, quando tem setores que ficam nos criticando nas redes e que não conseguem ser sinceros com as suas bases, e dizer que não querem tirar Bolsonaro agora. Então eu chamo a sinceridade das pessoas, elas precisam ser lúcidas nas suas opiniões.

OC – Partidos de esquerda e agora também de centro, além entidades estudantis e centrais sindicais, estão organizando uma grande mobilização contra Jair Bolsonaro para o próximo dia 2 de outubro. Como está sendo a construção desse ato e quais as perspectivas para este dia?

BB – Nós estamos desde o dia 7 de setembro montando reuniões com esses setores para pensar no palco. As mobilizações que temos feito pelo “Fora Bolsonaro”’ geraram um importante movimento de articulação para que isso pudesse se ampliar e eu acredito, que o próximo dia 2 de outubro, pode ser um grande palco desse processo. Figuras institucionais como o governador Flávio Dino (PCdoB), o vice-presidente da Câmara dos Deputados Marcelo Ramos (PL), o deputado federal Marcelo Freixo (PSB), o próprio Ciro Gomes. Considero importante também esse esforço final da presença de figuras mais à direita como Doria (PSDB), Mandeta (Democratas), Simone Tebet (MDB) e todas as outras pessoas que possam contribuir na luta pela democracia precisam estar no dia 2 de outubro.

Essa mobilização é para que na democracia a gente consiga poder continuar divergindo daqueles que nós somos contrários e podermos apresentar, dentro da democracia, um novo projeto de país que nós queremos. E dentro desse projeto país, um projeto educacional que possibilite aos estudantes e ao povo brasileiro terem dignidade no processo de educação.

Convite – Para finalizar, Bruna Brelaz fez uma convocação para a população participar das mobilizações contra a gestão do presidente Jair Bolsonaro que irão ocorrer no próximo sábado, 2/10, em todo país.

“Eu considero que o dia 2 é esse palco, o palco da defesa da democracia como se fossem as novas “Diretas Já”. Serão um marco na história desse país. E a gente convida todo o Brasil, toda população do Amazonas para que se juntem e se somem para que no dia 2 de outubro possamos ter força e amplitude em fazer com que esse país pegue fogo. É ferver essa mobilização pelo impeachment de Bolsonaro e em defesa do Brasil”, concluiu.

 

Fotos:

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Por Lana Honorato

Fotos: Marcus Reis/ Yuri Salvador/ Divulgação

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