A comercialização de medicamentos feitos à base do Cannabis e as pesquisas em torno da eficácia do produto foram alguns dos assuntos tratados no quadro “Erica Lima Conversa”, do Portal O Convergente desta quinta-feira, 19/8, com o farmacêutico André Fiorini.
O especialista, que é representante da Ecogenlabs no Amazonas, falou também sobre a eficácia do canabidiol, – substância extraída da planta Cannabis -, e o potencial terapêutico para o tratamento de doenças como Alzheimer e epilepsia refrataria.
Para o especialista é importante desmitificar o preconceito em torno do uso dos medicamentos à base da substância. “A Cannabis é uma planta que se usa há mais de dez mil anos como medicamento e faz pouco tempo que se discutiu inserir, cientificamente, para o uso indiscriminado no meio medicinal”, esclareceu.
O farmacêutico esclareceu, brevemente, sobre os primeiros registros históricos quanto ao uso da Cannabis no mundo e disse que a introdução no Brasil se deu através dos escravos. Fiorini aproveitou para explicar também sobre a diferença da planta para o uso medicinal e a usada como droga, o que gera muita polêmica quando a legalização da produção, da comercialização e do uso no País.
“Uma coisa é você tratar doenças com Cannabis, outra coisa é você legalizar uma droga. São coisas completamente diferentes. Muitos medicamentos, por exemplo, são derivados de drogas antigas. A morfina é derivada de uma droga. Então a Cannabis, por ter essa pecha de droga, o ideal é que a gente separe isso. Tanto é que a discussão no Congresso tem que ser desvinculada”, defendeu.
Segundo Fiorini, a Cannabis medicinal ajuda a combater diversas doenças e manifestações, já a maconha, a droga, envolve outro tipo de política e a atuação precisa, de fato, ser discutida. Ele aproveitou para explicar os benefícios já comprovados com o uso medicinal da planta e a eficácia dos medicamentos à base da mesma.
“Ela atua no sistema endocanabinóide, que é o grande maestro do nosso organismo. Ele controla as funções neurológicas, as funções até alérgicas. Ele promove a homeostase, que quer dizer equilíbrio. Então ele que faz o organismo funcionar em vários aspectos”, esclareceu.
Eficiência e estudos – O especialista esclareceu ainda que em função disso, do endocanabinóide ser um sistema responsável por regular processos fisiológicos, como apetite, dor, inflamação entre outros processos no corpo, o Cannabis tem muita eficiência no tratamento de doenças degenerativas.
“A função cerebral dele é uma função de estabilidade. Então quando a pessoa tem muitas convulsões, ele ajuda a volta à normalização. Ele também ajuda no tratamento da doença de Parkinson, onde o paciente tem deficiência de dopamina, que é um neurotransmissor. O sistema edocanabinóide regula essa questão da dopamina também”, explicou ele citando ainda a eficiência do produto para os pacientes que fazem tratamento de câncer com quimioterapia.
Em relação ao avanço dos estudos envolvendo os remédios à base de Cannabis, Fiorini explicou que os mais robustos nesse sentido, atualmente, são os relacionados a epilepsia refrataria. Onde, segundo ele, o canabidiol estabiliza a função cerebral.
“Além dos estudos, a gente tem muitas evidências. Os mais robustos são para epilepsia refrataria. No caso do Alzheimer e do Parkinson são doenças que estão sendo muito pesquisadas, mas não tem estudos concretos”, disse o farmacêutico ao explicar que muitos estudos esbarram na padronização do produto que se usa, como a dose, a concentração e o produto que foi utilizado na composição do medicamento.
O farmacêutico falou também sobre o andamento dos estudos feitos no Brasil e sobre a participação dos laboratórios nesse processo, bem como sobre as dificuldades de avanço dessas pesquisas no País. “Hoje estamos participando de um estudo na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) com mastócitos, na questão inflamatória e de câncer. E tem um estudo na Universidade Federal da Bahia”, falou.
Aprovação e preço – Além de esclarecer em que doenças o uso do Cannabis pode ser utilizado, Fiorini detalhou o que já foi aprovado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em relação ao uso do componente retirado da planta e o que a lei rege sobre essa questão.
“A Anvisa, em dezembro de 2019, a no RDC 327, coloca o canabidiol disponível nas drogarias do Brasil. Só que ele autoriza a produção no Brasil. E o que é proibido? Você não pode plantar, trazer parte de plantas, sementes e tal. O produzir é trazer o óleo e fracionar o óleo. Isso que é produzir”, explicou.
O farmacêutico se refere à Resolução da Diretoria Colegiada (RDC), no 327, de 9 de dezembro de 2019, que dispões sobre os procedimentos para a concessão da Autorização Sanitária para a fabricação e a importação, bem como estabelece requisitos para a comercialização, prescrição, a dispensação, o monitoramento e a fiscalização de produtos de Cannabis para fins medicinais, e dá outras providências.
Sobre a venda dos medicamentos à base do composto nas drogarias do aís, liberado pela Avinsa em 2019, ele explicou que a disponibilidade existe, porém o preço para quem precisa é exorbitante. Sendo um frasco com, aproximadamente, 30ml do produto custa em média R$ 2,3 mil.
“Além disso, tem outra forma de se conseguir o canabidiol que é importando. O que é possível somente com uma receita médica com a prescrição, onde o paciente preenche um cadastro na Anvisa e tem a autorização liberada, em média, de cinco a dez dias. Com isso, o paciente fica apto a importar o produto por cerca de R$ 800”, falou.
Sobre as normas em torno do uso do medicamento e a acessibilidade do mesmo, de uma forma mais barata para a sociedade, ele acredita que isso deve ocorrer em breve pois, segundo ele, é algo inevitável. “Isso é uma questão de tempo. Só de já ter isso na drogaria, apesar do valor, é uma evolução muito grande”, opinou.
O especialista falou também sobre a importância de checar a idoneidade do produto, que pode ser feita pesquisando informações sobre os produtores e se informando com especialistas e pacientes que já utilizam os medicamentos à base de Cannabis, em algum tratamento.
Fiorini relatou como tem tratado sobre o assunto com movimentos e familiares de pacientes que defendem o uso do Cannabis na forma medicinal e pedem celeridade da legislação em trono do assunto no Brasil.
“Eu também procuro essas pessoas para trocar informações. Informar o que sei, para a gente poder conseguir isso e deixar as pessoas com opções de tratamento”, afirmou o especialista, que já participou de várias palestras sobre o assunto como forma de disseminar informações relativas a tratamentos, vendas e legislações vigentes no Brasil.
Confira a entrevista na íntegra:
Confira imagens da entrevista:
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Por Izabel Guedes
Fotos: Marcus Reis